AÇÕES AFIRMATIVAS NO ENSINO SUPERIOR: ESTUDO SOBRE A POLÍTICA DE COTAS SOCIAIS EM UMA UNIVERSIDADE DO ESTADO DA PARAÍBA – BRASIL

Resumen

Este estudo teve como objetivo avaliar a efetividade da política de cotas sociais nos cursos da área de saúde da Universidade Estadual da Paraíba - UEPB, Campus I, nos anos de 2014 a 2019. Trata-se de um estudo retrospectivo, de caráter observacional e descritivo com abordagem quanti-qualitativa. A amostra foi do tipo não probabilística, por conveniência, composta por 23 discentes cotistas, concluintes dos cursos de bacharelado da área de saúde dos cursos de Fisioterapia, Enfermagem, Farmácia, Ciências Biológicas (diurno e noturno) e Odontologia, beneficiados pela política de cotas sociais da UEPB - que considera alunos oriundos da rede pública de ensino, a renda familiar per capita e/ou a presença de deficiências. A pesquisa foi realizada no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - CCBS da UEPB, Campus I, Campina Grande-PB, Brasil e utilizou como critério de inclusão, discentes cotistas que ingressaram no semestre 2014.2 e concluíram o curso no semestre 2019.2 em 05 anos de graduação. A escolha por amostra composta entre alunos concluintes dos cursos de saúde deve ser considerada como importante fator de recorte, isto porque, culturalmente os cursos da área de saúde foram considerados durante muito tempo, elitizados. Para caracterização da amostra foi utilizada uma Ficha de dados sociodemográficos com a finalidade de obter um perfil da amostra, sendo composta pelas variáveis, idade, religião, sexo, renda familiar média, naturalidade e residência, os dados foram processados pelo software SPSS 19.0 e analisados pela estatística descritiva. Os instrumentos de coleta de dados utilizados foram a Entrevista semiestruturada e a Técnica de Associação Livre de Palavras (TALP). As narrativas oriundas das entrevistas foram processadas pelo software IRAMUTEQ e os dados obtidos pela TALP foram processados através do software Tri-Deux-Mots (versão 2.2) e analisados pela Análise Fatorial de Correspondência. Os resultados de acordo com a estatística descritiva apontaram que o perfil preponderante entre a amostra foi de indivíduos do sexo feminino (78,3%, n=18), autodeclarados pardos (69,6%, n=16); tendo como grupos etários igualmente prevalentes os de indivíduos entre 20 a 24 e 25 a 29 anos (47,8%, n=11 em cada um destes grupos) e com renda familiar mensal média de até 2 salários mínimo (69,6%, n=16), com origem em Campina Grande, sede de seus cursos (69,6%, n=16). Os discursos revelaram o papel educacional, cultural e social do ensino superior; capaz de expandir horizontes e aumentar a criticidade social e autonomia intelectual dos indivíduos. Por serem concluintes, os alunos representam a efetivação do acesso do jovem pobre a cursos de saúde; contudo, as taxas estimadas de evasão indicaram que a maior parte dos cotistas não concluíram ou atrasaram a conclusão prevista do curso. A não conclusão e o atraso para o término do curso, podem ser indicativos das muitas dificuldades que os jovens estudantes enfrentaram para manter-se no ambiente acadêmico. As dificuldades de manutenção podem estar relacionadas a fatores pessoais, mas, conforme os discursos avaliados, são majoritariamente relacionadas às barreiras financeiras. Estas dificuldades atuaram como fatores predisponentes à desmotivação e à evasão; além de que, são raízes da busca de alunos por empregos – pelos discursos, fora das áreas da formação – no contraturno das atividades acadêmicas. Os alunos que relataram conciliar estudo e trabalho, citaram como esta dupla-função comprometia a participação em atividades extracurriculares e no envolvimento completo com a própria rotina da vida acadêmica. Ainda com relação aos discursos, houve pouca citação de apoio institucional a manutenção dos discentes, sendo dado pouco enfoque pelos discentes ao alto nível de burocracia e requisitos para acesso aos benefícios financeiros ofertados e insuficiência de recursos materiais, como livros ou instrumentários. As bolsas estudantis de pesquisa e extensão foram citadas como forma relevante no processo de manutenção. Muitos estudantes citaram também dificuldades relacionadas a comprometimentos da formação básica, relacionadas com as diferenças de arsenal cultural que afeta sujeitos de classes economicamente menos favorecidas. Considera-se que a avaliação dos discursos somadas ao embasamento teórico, revela que a oferta de vagas em regime de ação afirmativa é sim, ferramenta importante no processo de democratização da universidade, isto porque, minimiza as distâncias entre as realidades de camadas sociais altamente distintas; contudo, as cotas não excluem as diferenças formativas nem solucionam variáveis socioeconômicas altamente relevantes para o processo de conclusão do curso superior. Duas lacunas no programa de cotas convergem para a fragilização de vínculo do discente com o curso escolhido, seja por dificuldade em acompanhar a rotina e as exigências acadêmicas ou pela real impossibilidade de dedicação por necessidades básicas da vida, como sono, alimentação e moradia, serem comprometidas.